terça-feira, 26 de julho de 2016

Nenhum de Nós (1987)

1º Álbum da banda gaúcha Nenhum de Nós que ainda contava com a banda na formação em trio. Lançado em 1987.

eNTrevistão: Oswaldo “Rock” Vecchione (Made in Brazil)

Quarenta e oito anos é estrada a dar com pau!
eNTrevista cedida ao 
AZOOFA


Sentado à mesa do extinto Garage Studio com a lenda Oswaldo “Rock” Vecchione, que compartilhou boas doses da vivência que só a experiência de ter uma banda de rock há quase meio século faz acumular – sob a cuidadosa supervisão de seu irmão, Celso “Kim” Vecchione, o homem da memória impecável – vi figuras de peso entrarem na sala e se juntarem ao time, como Sérgio Hinds (O Terço), Johnny Boy (Raul Seixas, Walter Franco, Sérgio Dias, Ira!, entre outros), Clemente (Inocentes) e Theo Werneck. O diálogo foi mais ou menos assim:

AZOOFA - Tudo começou por aqui, mesmo, na Pompeia. Qual a importância desse bairro para o rock n’roll paulistano?
Tinham bairros sem nenhuma banda de rock, aqui tinham várias. Em uma certa época, no começo dos anos 70, tinham quatro bandas que excursionavam pelo Brasil levando o rock. Uma delas era do Rio, que era o Terço. As outras três eram da Pompeia: Os Mutantes, o Tutti-Frutti, que a Rita veio trabalhar depois que saiu dos Mutantes, e o Made. Depois apareceram no circuito o Casa das Máquinas, os Pholhas. Mas tanto os Pholhas como o Casa das Máquinas eram bandas de baile, que tinham um set de rock legal e que resolveram investir nesse set. O oposto do Made, Rita Lee e Tutti Frutti, que são músicos focados no rock, que começaram no rock e tão no rock. A Rita saiu um pouquinho pra fazer um lance mais rock pop, mas é lógico que tem toda uma referência dentro do rock.
Você é o único que não deixou a banda nem por poucos meses, desde a fundação. Nenhum outro projeto – até em outras áreas –  te seduziu a ponto de largar o Made, mesmo que temporariamente?
Dentro do Made eu trabalhei com muitas coisas. Fui forçado a virar produtor de shows, por exemplo. Quando a gente parou de gravar com multinacionais, como nos quatro primeiros discos, que são da RCA (hoje em dia o catálogo está com a Sony), e nos três seguintes, que são da RGE, que não era uma multinacional, mas era uma gravadora de médio porte no Brasil, a gente resolveu investir. Numa certa época – quando o Made mais trabalhou, mais ou menos até lançar os dois Piratas (discos ao vivo) –, de 75 a 89, eu fui produtor de 60% dos shows. O restante eu vendia. Era assim: se a gente tinha algum produto novo, um disco ou um show e queria tocar, sei lá, em Campinas, em Porto Alegre, em Belo Horizonte, ou em Blumenau, eu tentava vender. Se eu não conseguisse, dava um pulo na cidade, alugava um espaço que poderia ser um ginásio, um teatro, um auditório ou um salão grande de um clube e produzia. Eu tinha um esquema de uma gráfica forte por trás, um pessoal que colava cartazes pra mim aqui ou em qualquer lugar. Uma vez foram colar cartaz pra mim no Rio de Janeiro e lá não tinha esse esquema. Os cariocas se assustaram quando o Made chegou. Era pra lançar o Banana (disco de estreia, homômino, apelidado pelos fãs e pela banda de O Disco da Banana), a gente ficou duas semanas no Teatro Tereza Rachel e já chegou importunando! O cartaz dizia: “Não acreditamos que o carioca não gosta de rock!”. Aqueles puta lambe-lambes na parede… Nossa Senhora! Mas foi legal, foi uma temporada que rendeu casa cheia. Isso era legal pra divulgar o show, mas também foi um tiro no pé no show Massacre, em 77. De um dia pra outro cinco mil cartazes na rua, com um tanque de guerra esmagando a palavra “Massacre”. Era pra esmagar umas cabeças, mas no final a gente resolveu tirar as cabeças e colocar a palavra “Massacre” e o tanque andando em cima. Isso aí nos rendeu o cancelamento da tour e a apreensão do equipamento.
Por conta dos cartazes?
Lógico! Ditadura, governo militar, censura. Eu aluguei o Teatro Aquário, que era, dos particulares do Brasil, o maior, eu acho. 1400 ou 1600 lugares. Minha memória não tá tão boa, mas de qualquer jeito era o maior que tinha e aluguei pra duas temporadas, duas semanas. A gente levou o equipamento na segunda, montamos na terça, na quarta fizemos o ensaio geral e na quinta começava a temporada. Quinta, sexta, dois shows no sábado, dois no domingo e na outra semana a mesma coisa. Na quinta-feira, o (ator) Altair Lima – que era dono do teatro – me ligou, quase chorando, as quinze pras seis da manhã. Ele falou: “Oswaldo, pelo amor de Deus, cara, o que vocês fizeram? Os caras interditaram a rua! O teatro tá lacrado!”. E com o nosso equipamento dentro! O Altair produzia peças infantis de sábado e domingo, então o prejú que a gente ia levar ia ser dobrado pra ele. Não era nem oito horas da manhã e a gente já tava no teatro com ele e ele apavorado, branco com o lábio roxo. Pensei que ia ter um infarto! Ele falou: “Não, cara, vocês têm que dar um jeito! O que vocês fizeram? Acho que foram esses cartazes, vocês sujaram a cidade! Quantos cartazes vocês colocaram?”. Eu falei: “Botamos cinco mil e ainda tem dois mil guardados pra semana que vem.”. Ele disse: “Não, não bota mais nenhum!”. 
Você ainda tem esses cartazes?
Não, tenho só o arquivo. Depois virou a capinha do disco. Aliás, esse ano a gente lançou o Massacre em vinil.
Isso que eu ia te perguntar agora! Foi censurado na época, saiu em CD em 2005 e esse ano com uma tiragem de trezentas cópias em vinil, é isso?
Trezentas cópias, pra colecionador. Disco colorido, numerado.
Do jeito que era pra sair na época! Eu ouvi dizer que vai sair um Massacre Vol. 2. Como vai ser isso?
Já estou negociando. Eu arrumei um arquivo de um show no Rio, com o Wander Taffo na terceira guitarra, junto do meu irmão e do Dudu Chermont, o Percy Weiss (segundo vocalista da banda, falecido este ano) nos vocais, eu no baixo e o Juba, que depois saiu do Made e foi pra Blitz, na batera. Além disso, tem cinco sobras que estão no CD, mas não entraram no LP, porque vinil é aquela coisa, dezessete minutos e meio de cada lado, senão perde a qualidade. Então o lado A do Vol. 2 provavelmente terá essas sobras e o lado B será o melhor dessa uma hora e vinte, uma hora e vinte e cinco minutos que eu tenho desse show.
Sai esse ano, ainda?
Não. Provavelmente sai pros cinquenta anos do Made. Tô negociando com o Danilo (Guedes), da Mafer Records, que fez com o maior capricho essa tiragem do Massacre, ou lançar em LP um desses discos com material inédito que a gente só soltou em CD, tipo o Sexo Blues e Rock n’Roll e o Rock de Verdade, um daqueles acústicos ou algum material com o Cornelius (Lúcifer, primeiro vocalista da banda, falecido em 2013) cantando. Ele até me pediu isso, pra gente soltar um disco do Made em tributo ao Cornelius. Eu tenho muita coisa em VHS. Já comecei a levantar esse arquivo pra depois dar uma masterizada no áudio e ver se é possível mesmo lançar um LP tributo à ele.
A banda possui várias influências, mas podemos dizer que Rolling Stones foi o ponto de partida do Made in Brazil?
Eu acho que foi o ponto de afirmação, porque a gente não tocava só Stones, tocava Kinks, Animals, Yardbirds…
Oswaldo, por que você resolveu assumir o vocal da banda por completo no disco Minha Vida É Rock ‘n’ Roll? Seus vocalistas te davam muita dor de cabeça?
Eu comecei como segundo guitarrista, meu irmão sempre foi o primeiro. Ele que me ensinou a tocar, inclusive. De 1967 a 1972, início de 1973, eu fiquei nessas. A gente teve uma fase em que o nosso baixista na época, o Alberto, vazava quando chegava o verão e a gente era obrigado a botar um segundo baixista pra cumprir a agenda de shows na temporada. Ele simplesmente ia viajar, não queria nem saber! E em 1972 a gente começou a compor o que viria ser futuramente o material do Banana, mas o Alberto não sentia firmeza. Ele não achava que a banda tinha que investir em músicas em português. Ele achava que, como a gente tocava os mega sucessos de todo mundo, não ia ter material próprio à altura do que o pessoal fazia lá fora. Erro dele. Aí chegando o verão, a gente já sabendo que ele ia abandonar a banda, resolvemos procurar um baixista pra colocar no lugar dele em definitivo. E testamos um, testamos dois, teve um que fez até um anúncio publicitário com a gente mas acabou nem ficando no Made, o Rafael. Aí meu irmão falou: “Se a gente não arrumar alguém logo, vai acabar parando. Passa pro baixo pra gente continuar ensaiando e a hora que pintar um baixista você volta pra guitarra!”. Acabei adaptando um jeito de tocar com uma linha melódica meio Stones, mas com um baixo heavy metal junto. Eu não tinha referência de ninguém que tocava igual. Depois eu fui ver que a Suzy Quatro tocava assim, o baixista do Status Quo (Alan Lancaster) também, além dos caras que foram aparecendo, como o (Geezer Butler) do Black Sabbath, o (John Wetton) do Uriah Heep e o (Roger Glover) do Deep Purple, as vezes. Em 1979 a gente já tinha passado por três ou quatro cantores antes de gravar o primeiro disco. O Cornelius saiu da banda brigado, o Percy gravou o Jack O Estripador (segundo disco do Made), mas eu queria um cara mais técnico que ele. Botei o Caio Flávio pra gravar o Paulicéia Desvairada (terceiro álbum da banda), mas ele não se fixou, aquela formação não deu muito certo. Ele era muito técnico, mas o esquema não deu certo. Mudamos a estética da banda, a linha melódica e gravamos mais baladas, r&b e blues.
Aí que surge o dedo do Ezequiel Neves (crítico musical e produtor dos discos do Made Jack O Estripador e Paulicéia Desvairada)? 
O Zeca nos ajudou no Jack e no Paulicéia. Ele entrou na história pra gente não correr mais aquele risco de fazer a gravação do jeito que a gente queria e, de repente, a gravadora achar que tinha que ter um dedo mais comercial ali no lance. A gente botou o Zeca lá como amigo, pra ele assinar lá. Ele não entendia nada de gravação. Mas, pô, quem iria contra o maior crítico de rock do Brasil? O que ele falava e escrevia eram leis! E ficou do jeito que a gente queria. O Zeca subiu em cima do palco também, cantou com a gente, fez as viagens. Convivemos muito. Ele era do cacete. Como pessoa, ele faz muita falta também (Ezequiel faleceu em 2010). Sinto muita saudade dele, da alegria, do alto astral. Nas viagens, é importante ter um cara alegre, que não deixa a peteca cair, que faz uma piada atrás da outra, que conta casos da vida dele e dos outros. A gente ria muito com o Ezequiel. E com muitos músicos que viajam com a gente até hoje também. Eu e o meu irmão as vezes abrimos mão de ter um cara técnico pra ter um amigo, alguém que tá aprendendo. Durante esses quarenta e oito anos, a gente investiu em muitos amigos e em muitos músicos que a gente achava, como pessoa, fundamentais pra estarem com a gente naquele momento. Não tanto como músicos, como guitarrista, como baterista, tecladista, sacou? É loucura falar isso, afinal somos uma banda de rock. Mas essa é a verdade. Talvez seja esse o motivo da nossa longevidade.
Obrigado pela entrevista, foi uma honra. Gostaria de deixar alguma consideração final?
Queria convidar o pessoal pro show, a ideia é se divertir! Como o Ezequiel falava, rock é um exercício de descontração, é alegria. A gente tenta passar isso pras pessoas, sempre tentamos. Quando a gente consegue, maravilha!

"Pra Ficar Legal"

Humberto Gessinger

"Faz Parte"

Humberto Gessinger

segunda-feira, 25 de julho de 2016

eNTrevista: Dinho Ouro Preto

"É meio assustador ver todo o rock ficar de direita" Em artigo de Mônica Bérgamo para a Folha de SP, Dinho Ouro Preto do Capital Inicial fala sobre família, música, Stones e política: Dinho Ouro Preto anda preocupado. "Com o Brasil, com a guerra na Síria, com esse louco do [Donald] Trump nos Estados Unidos. Que gente é essa, cara?" De família de diplomatas, filho de um cientista político e de uma historiadora, o vocalista do Capital Inicial bem poderia ter ido trabalhar com os temas que o afetam. "Mas aos 19 anos a banda caiu na minha cabeça! E tô aqui, 33 anos depois", diz ao repórter Joelmir Tavares. Foi uma pancada. "No meu primeiro show, na saída do vestibular da Universidade de Brasília, em 1983, eu sentia um pavor, medo de encarar as pessoas. Bebi pra caraca e não olhava pra cara de ninguém. E durante anos eu não conseguia. A impressão era que eu não tava preparado pra aquilo, sabe? Tudo aconteceu muito rápido." Faz "uns dez anos", conta Dinho no estúdio nos fundos de sua casa, nos Jardins, que ele "se tocou" que não tinha mais volta. Que não havia espaço para uma carreira acadêmica, como ele imaginava na adolescência. Que seu destino era mesmo o rock, apesar de ter ficado muito tempo lutando contra isso. Pela cabeça que hoje se ocupa de música a maior parte do tempo, também passa muita informação. "Sou meio um 'junkie' [viciado] de notícias. Leio dois jornais por dia, fico na internet, vejo BBC e CNN. Pode ser uma obsessão!" E um dos vícios que restaram, de uma lista que já incluiu café, cigarro, álcool e drogas (desde maconha e LSD até ácido e cocaína). Aos 51 anos, diz que parou com tudo, só bebe um pouco após os shows e nunca esteve tão saudável. Toda manhã ele corre 5 km no parque Ibirapuera, perto de casa, ou na academia. "Comecei com essa mania de esporte. E comecei a tocar mais. Talvez as obsessões tenham ido mais pra essas coisas. Todo santo dia sento no estúdio, fico tocando, compondo." Nas paredes do local, quadros com álbuns recordistas de vendagem e troféus. Num mural, a foto do grupo assinando em São Paulo o primeiro contrato com a gravadora, "sonho de toda banda na época". O registro foi no porão da casa na Bela Vista onde os músicos de Brasília se espremiam sob um teto baixo e côncavo para ensaiar.



"A gente botava umas almofadas na janela pra não vazar o som. O Zé Celso [Martinez Corrêa, diretor de teatro] morava lá perto e eu lembro que ele passava e falava: 'Yeah, que legal!'. Mas a vizinhança toda odiava a gente!" Aponta um quadro com um disco de ouro: "Esse a gente gravou três anos depois daquele show no dia do vestibular. Hoje, quando eu ouço, eu percebo que não tava no meu tom... A gente não sabia nem o nome dos acordes". É por causa das memórias dessa época que ele tem gostado tanto de "Vinyl", série de TV sobre a música nos anos 1970 produzida por Martin Scorsese e por Mick Jagger. "É legal porque aparece a primeira geração do punk. E é na raça, arranjos muito simples." Fã dos Rolling Stones, Dinho deixou passar a chance de vê-los durante a vinda mais recente da banda a São Paulo. Tem evitado os megashows por causa da multidão e do barulho. Isabel, 16, a filha do meio, foi a pessoa da família que mais chegou perto de Jagger. Ela é colega de escola de Lucas, filho dele com a apresentadora Luciana Gimenez. E o inglês foi lá inaugurar um centro de artes, com os alunos na plateia. "Será que eu teria saco?!", pergunta o líder do Capital Inicial ao falar dos Stones, que, após os 70 anos, seguem na estrada. "Como pode? Acho que vou até uns... 60. Será? Depois é morar no sítio, com os cachorros, tocando violão." O Capital está em turnê pelo país com o show do disco novo, um acústico gravado em Nova York com sucessos de 2002 a 2015. A estreia em SP foi num Citibank Hall lotado. "Eu não quero que o Capital tenha cheiro de naftalina", diz Dinho, que já faz músicas para um próximo álbum. "Não quero que as pessoas venham ver o Capital pra 'pô, vamos relembrar como eram legais os anos 1980'." Se naquela década o rock nacional vivia o auge, hoje é a vez do sertanejo –estilo que o cantor não ouve e não gosta. "Teve um predomínio nosso nos anos 1980, um momento do axé nos 1990. Mas isso não anulou a diversidade cultural. Os ritmos permaneceram. Essas ondas vão e vêm." Dinho sai do estúdio e cruza a chuva até a porta da sala. Fala de Pinga, a cadela de seu sítio em Indaiatuba (SP) que passou uns dias com ele na capital para se recuperar depois que perdeu uma das patas dianteiras ao atacar uma máquina de cortar grama. Pega o celular e mostra um vídeo dela com o Uísque e a Tequila, seus outros cães. "A gente achou que ela passaria a morar aqui, mas ela tá correndo! É surreal!", diz, incrédulo porque a border collie continua com equilíbrio e agilidade. Como a maior parte dos 80 shows que faz por ano é no fim de semana, Dinho acaba indo menos ao sítio do que a mulher, Maria, e os filhos. Além de Isabel, o casal também tem Afonso, 12, e Giulia, 18, que se mudou para os EUA para estudar ciência política. "Tento fazer meu melhor como pai. Mas fico com medo de errar, né? Você pensa no que seus pais erraram. E se pega repetindo coisas que eles diziam e você odiava. Outro dia ouvi do Afonso algo que eu falava pra minha mãe: 'Pô, tudo que eu falo você acha ruim!'." Com o pai roqueiro, os três podem "tocar em qualquer assunto, não tem tabu com sexo, drogas, bebida". Ele senta num sofá diante da estante de CDs e vira o disco. Diz que sente "angústia" com a situação do país e que "é meio assustador ver todo o rock ficar de direita" –Dinho se define como de centro-esquerda. "No momento, sou contra o impeachment. Fui para as Diretas-Já. Acho a Dilma um desastre, mas a democracia é maior do que o desastre dessa mulher. Queria que ela terminasse o mandato." Pelo vidro da janela, ele vê a estreita passarela de cimento no jardim onde reaprendeu a andar em linha reta após cair do palco durante um show em 2009. Sofreu traumatismo craniano e quebrou vértebras com a queda de 3 m de altura. Internado, teve uma infecção grave. "Estive perto da morte duas vezes." Levou seis meses para se reabilitar com a ajuda da fisioterapia. "Foi foda." Sente dores até hoje. "Continuo tão hipocondríaco quanto eu era antes [risos]. Eu sou agnóstico, não sou supersticioso, sempre fui hedonista. Não foi o acidente que me fez perceber o valor dos meus relacionamentos, da minha família, dos meus filhos, dos meus amigos, ou da sorte que eu tenho de fazer o que eu faço." Ele segue: "Já tinha meio caído a ficha de que eu era um sortudo, sabe? E o acidente... Acidente é um perrengue. Só. Não tem nada de bom, velho [risos]. É uma merda".

terça-feira, 19 de julho de 2016

Tape e Scandurra - Hoje o Tempo

O pós-punk vive em “Hoje o Tempo”, de Tape e Scandurra

Nem sempre um mais um é igual a dois: na dupla Tape e Scandurra, o resultado da soma das partes é infinito.
Formado pela cantora Silvia Tape e pelo guitarrista Edgard Scandurra, o projeto começou a se desenhar em 2009, quando o guitarrista começou a compor o material que formaria o disco de estreia da dupla, EST. “Eram temas para um possível disco instrumental”, diz o músico. Porém, essa ideia de manter as músicas sem letra foi por água abaixo quando Edgard viu Silvia cantando versos de Fausto Fawcett. A experiência foi tão impactante que bastou para que ambos se interessassem por criar uma dupla juntos e, agora, falta muito pouco pra sair seu disco de estreia.
EST será lançado amanhã em formatos digitais e, no ano que vem, em CD e vinil (em parceria com o Selo 180).
Logo aqui acima, você pode escutar “Hoje o Tempo”, que traz a bateria de Curumin, o baixo synth de André Lima, as programações de Kuakekr, além do canto e guitarra de Scandurra e da voz e letra precisas de Silvia Tape. A quarta faixa de EST se situa entre o pós-punk e o samba-canção, trazendo uma fusão simples e grandiosa, recheada de camadas de guitarras e efeitos eletrônicos.

Lulu Santos no Programa Mixto Quente

Tesouros da juventude - Areias escaldantes - Sincero

Legião Urbana - Soldados - Ao Vivo

Verão de 1986. Programa Mixto Quente da Rede Globo. Raro registro da Legião Urbana apresentando seu primeiro disco.

TITÃS: um ranking do pior ao melhor álbum

Por Marcos Andrade


Enquanto Houver Sol“, “Provas de Amor“, “Epitáfio“? Vão se foder! Porque aqui nesse ranking, só álbum sinistro e escroto é que vai ter!
Brincadeiras à parte, não existe disco ruim dos Titãs(pelo menos na opinião deste que vos fala, com intenção nenhuma de fazer média). Por outro lado, há aqueles bons registros que não deixaram sua marca para a posteridade, os medianos e os que beiram a genialidade que ficaram esquecidos no meio do vasto catálogo e dos trabalhos mais conhecidos e renomados do grupo. Sem injustiças, todos os álbuns da banda foram revisitados e escutados exaustivamente para decidir: Qual o melhor? E o pior? E quais figuram entre os melhores, mas ficam na sombra do badalado, relançado e comemorado Cabeça Dinossauro (será ele o número um)? Descubra!
14. Como Estão Vocês? (2003)

Ainda alquebrados pela morte de Marcelo Fromer em 2001 e pela saída de Nando Reis em 2002, os Titãs não estavam tão bem quanto queriam demonstrar na faixa de abertura (“Nós Estamos Bem“, por sinal uma das melhores do trabalho). Mesmo que “Provas de Amor“, “Eu Não Sou Um Bom Lugar“, “Ser Estranho“, “Vou Duvidar” e “A Guerra É Aqui” sejam bacanas, o disco se estende muito e é um dos mais fracos do grupo, dando a entender que o produtor Liminha e os integrantes não foram tão exigentes com suas próprias habilidades e potencial.
13. As Dez Mais (1999)
Em clima de férias depois dos sucessos comerciais do Acústico MTV e de Volume DoisAs Dez Mais é o único álbum do grupo sem nenhuma inédita e se limita a homenagear os artistas favoritos dos integrantes. Se algumas versões ficaram muito boas, a exemplo de “Gostava Tanto de Você” e “Querem Acabar Comigo“, outras careceram de inspiração (“Rotina“, “Sete Cidades“). “Pelados em Santos“, que ganhou até clipe, ficou anos luz aquém da original, mesmo sem pretensão nenhuma de sê-lo.
12. Sacos Plásticos (2009)
Massacrado por uma série de críticos, o último disco da banda com o baterista Charles Gavin não é desastroso como dizem, inclusive ganhou o Grammy Latino na categoria Melhor Álbum de Rock Brasileiro, dividindo o prêmio com Agora, do NX Zero (!).
Entretanto, as fracas baladas e a produção sem brilho de Rick Bonadio (não se pode acertar em todas) fizeram com que o registro entrasse em esquecimento pouco após ser lançado. Destacam-se a faixa título e as músicas “Problema” e “Deixa Eu Entrar” (com participação de Andreas Kisser).
11. Volume Dois (1998)
O campeão de vendas entre os trabalhos de estúdio dos Titãs surfou na onda do Acústico MTV e deu nova roupagem a outros sucessos da banda que não haviam entrado no registro desplugado e ao vivo de 1997.
Volume Dois peca pela falta de ineditismo, já que as inéditas presentes nesse álbum não são grande coisa assim como as do acústico. Seu grande trunfo são o cover de “É Preciso Saber Viver” e as versões para “Insensível” e “Não Vou Me Adaptar” (ambas presentes emTelevisão, de 1985), que ficaram bem melhores que as originais. Esta última, composta e cantada antes por Arnaldo Antunes, foi reinterpretada de forma belíssima com os vocais de Nando Reis.
10. A Melhor Banda de Todos Os Tempos da Última Semana (2001)
O último disco dos Titãs produzido por Jack Endino também foi o primeiro sem Marcelo Fromer (embora o guitarrista tenha participado de algumas composições). Variando entre faixas fortes (“Vamos ao Trabalho“), divertidas (“A Melhor Banda de Todos Os Tempos da Última Semana“) e o mega hit “Epitáfio“, talvez o maior defeito do álbum seja sua longa duração (quase 50 minutos).
Nando Reis sairia da banda no ano seguinte ao lançamento e suas letras já eram mais a cara do que viria a ser sua carreira solo, assim como ficou também evidente em Domingo.
9. Titãs (1984)
O álbum de estreia do grupo tem destaque principalmente pelas músicas que ficaram no repertório dos shows e na cabeça dos fãs por muito tempo, talvez até eternamente. Com a melhor balada da banda até hoje (“Go Back“, que recebeu melhores tratamentos posteriormente), o sucesso “Sonífera Ilha” e três versões de músicas estrangeiras reimaginadas em português (“Marvin“, “Querem Meu Sangue“, “Balada para John e Yoko“), não seria a fraca produção que transformaria o disco homônimo em um trabalho ruim. Ainda vale lembrar que esse é o único registro com o baterista André Jung.
8. Televisão (1985)
Já com Charles Gavin substituindo André Jung, os Titãs se juntaram a Lulu Santos(responsável pela produção) e, assim como em seu predecessor, gravaram mais uma série de faixas memoráveis que foram revisitadas em trabalhos futuros com um resultado muito melhor (“Pra Dizer Adeus“, por exemplo).
Ainda assim, “Insensível” e a faixa título chegaram ao topo das paradas ainda em 1985 e “Pavimentação” e “Massacre” eram tocadas nos shows com energia titânica. “Não Vou Me Adaptar“, reinterpretada no já citado Volume 2, tinha força assombrosa também em Televisão.Ciro Pessoa, que deixou o grupo antes da gravação do primeiro álbum, assinava algumas das composições.
7. Tudo ao Mesmo Tempo Agora (1991)
A partir daqui as decisões de ordem começam a ficar complicadas nessa contagem regressiva.
Sem ninguém para impedir a sujeira nas letras e no som, já que a produção do álbum foi dos próprios TitãsTudo ao Mesmo Tempo Agora (último de Arnaldo Antunes com o grupo) chega a soar meio exagerado em certas partes, mas conta com uma excelente abertura (“Clitóris“, que por sinal é animal ao vivo, com Paulo Miklos sempre destruindo na performance vocal) e reforça o rock de letras minimalistas que só a banda sabe fazer.
Alguns versos presentes nas músicas, como “A cabeça do pau/Faz esporra de leite/Pra tomar de manhã/No café da manhã” (em “Isso para Mim É Perfume“) assustaram o público e o trabalho vendeu bem menos que seus três predecessores. Ainda assim, é um belo exemplar de disco de rock cru e barulhento.
6. Domingo (1995)
Domingo resgatou a essência pop presente nos primeiros dois trabalhos dos Titãs, sem perder a consistência. Menos pesado (só um pouquinho menos), mas igualmente competente na execução do rock and roll, o disco colocou a banda novamente na crista da onda da popularidade.
Como de costume, a abertura é sensacional (“Eu Não Aguento“, composta pela banda Tiroteio e com introdução de “Sangue Latino”). Além de “Domingo“, faixas menos populares como “Tudo O Que Você Quiser“, “Tudo em Dia“, “Ridi Pagliaccio“, “Turnê” e “Uns Iguais aos Outros” merecem atenção.
O trabalho é o preferido do produtor Jack Endino.
5. Nheengatu (2014)
Com metade de seu contingente, os Titãs arrebentaram em Nheengatu, superando todas as expectativas. O disco é pesado, com letras fortes e cheio de palavrões, fruto de tudo o que o grupo revisitou durante os cinco anos sem gravar em estúdio (quando lançou Titãs e Xutos & Pontapés Ao Vivo no Rock in Rio 2011 e Cabeça Dinossauro ao Vivo 2012, focando em ambos quase que inteiramente no que havia de mais punk na carreira da banda).
Sérgio Britto berrou brilhantemente em “Fala, Renata” e Branco Mello surtou como em seus melhores tempos nas músicas “República dos Bananas” (composta tendo como base parte da obra do genial quadrinista Angeli), “Chegada ao Brasil” e “Canalha“. Bravo!
4. Õ Blésq Blom (1989)
Esse é o favorito de muita gente. Na época os Titãs eram mais populares que qualquer outra banda brasileira e aumentando novamente os elementos eletrônicos e o volume do baixo, o grupo foi mais pop sem deixar de ser rock.
Trazer a dupla de repentistas pernambucanos Mauro e Quitéria pra abrir e fechar o álbum foi uma maluquice genial que encaixou perfeitamente no perfil do disco. A transição de “Natureza Morta” para o riff icônico da mórbida “Flores” seria o melhor momento do trabalho, não fosse “O Pulso” roubar a cena na sequência. Mais um ponto pra produção de Liminha, que fez por merecer a sua alcunha de nono titã.
3. Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas (1987)
Um verdadeiro pecado colocar este álbum na terceira posição. Em seu quarto disco de estúdio, osTitãs apresentaram um entrosamento impecável. Mantendo o peso de Cabeça Dinossauro e adicionando elementos eletrônicos, a quase perfeição de Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas se deve muito ao fato das “podadas” cirúrgicas do produtor Liminha.
A dobradinha “Todo Mundo Quer Amor“/”Comida” cantada por Arnaldo Antunes e as épicas “Corações e Mentes” (“Às vezes acho que te amo/Às vezes acho que é só sexo”), “Diversão” (talvez a melhor música da banda) e “Violência” (esta última presente na versão em CD do trabalho) só faziam crescer a fama do grupo, que aproveitou o sucesso para gravar seu primeiro registro ao vivo logo em seguida (Go Back, de 1988).
2. Titanomaquia (1993)
O disco mais pesado de todos e o primeiro da banda sem Arnaldo Antunes não costuma ser tão reconhecido quanto os registros gravados entre 1986 e 1989. Todavia, em Titanomaquia osTitãs abraçaram um hard rock sinistro, sobrecarregado, tenso e nervoso. Claro que teve muito da produção de Jack Endino, que veio de Seattle tendo no currículo trabalhos com o Soundgarden,Mudhoney e NirvanaEndino, que viria a produzir mais 3 álbuns de estúdio com o grupo, é a segunda figura mais importante na história do então septeto, sem evidentemente considerar os integrantes.
Performances surtadas de Branco Mello (“Estados Alterados da Mente”, “Dissertação do Papa Sobre O Crime Seguida de Orgia”), Paulo Miklos (“Disneylândia”, “A Verdadeira Mary Poppins”) e dos guitarristas Marcelo Fromer e Tony Bellotto (em especial na faixa “Tempo pra Gastar”) dão o tom do disco, que não tem nenhuma grande música de sucesso entre as conhecidas do público geral.
1. Cabeça Dinossauro (1986)
Sem hipocrisia. Tem que ser muito diferentão pra falar que Cabeça Dinossauro não é a obra-prima máxima dos Titãs. O álbum é um dos melhores (senão o melhor) do rock brasileiro e um dos mais importantes da música nacional, ponto.
Tudo o que for falado sobre o terceiro disco do grupo provavelmente já foi dito, mas vale ressaltar que o trabalho foi o primeiro com o dedo de Liminha na produção (e também nas guitarras, percussão, bateria eletrônica…). Desde a capa com o homem urrando, passando pelas 13 destrutivas e emblemáticas faixas (11 delas tocaram nas rádios!), ficavam visíveis os novos rumos tomados pela banda, influenciada pelo punk e o funk rock.
Como é impossível escolher só um ou dois destaques, fica aqui a curiosidade (que o mundo inteiro já sabe) de que “Polícia“, cantada (ou seria gritada?) por Sérgio Britto (que também mandou muito bem nos agudos em “AA UU“) e composta pelo guitarrista Tony Bellotto (melhor composição do cara) resultou da revolta de Bellotto por sua prisão, juntamente com Arnaldo Antunes, por posse de heroína. Na época a indignação virava arte e não xingamentos semi-politizados vomitados de qualquer forma em redes sociais.
Em plenos anos 80, os Titãs não apenas lançavam como atingiam posições de destaque nas paradas e tocavam em programas de televisão músicas cheias de conteúdo e protesto como a já citada acima, “Homem Primata”, “Igreja” e “Bichos Escrotos”.
Consegue imaginar isso hoje em dia?

DVD 'Erasmo Carlos MeusLadosB' - Lançado em julho de 2015 pela Coqueiro Verde Records

LSD: livro inédito quer contar a história da música psicodélica brasileira



Ainda que tenha demorado um pouco a pegar por aqui, quando a onda enfim bateu o efeito do rock psicodélico no Brasil foi denso, belo e único. Partindo do disco-manifesto Tropicália ou Panis Et Circensis (reunindo os artistas do movimento em um álbum coletivo) como uma espécie de marco zero no Brasil, o livro Lindo Sonho Delirante, de Bento Araújo, pretende reunir 100 dos discos mais importantes da psicodelia nacional para contar uma história que pouco se conhece, a não ser pelos ouvidos: as raízes, o apogeu e a queda do rock psicodélico brasileiro.





Depois de intenso período de pesquisa, o livro reuniu nomes como Arnaldo Baptista, Rogério Duprat, Tom Zé, Ronnie Von, Rita Lee, Milton Nascimento, Secos & Molhados, Jorge Ben, Ave Sangria, Daminhão Experiência, Equipe Mercado, A Bolha, Egberto Gismonti, Arthur Verocai, Pedro Santos e Marcos Valle, entre muitos outros, em uma história recheada de resenhas, contextualizações históricas, informações detalhadas e vasta ilustração.







Do Tropicália, em 1968, o livro atravessa os oito anos seguintes até 1975, terminando no mais raro e mitológico disco psicodélico brasileiro: Paêbirú: caminho da montanha do sol, de Lula Côrtes e Zé Ramalho.






Trata-se de profundo material inédito sobre um verdadeiro tesouro nacional escondido, que cada vez mais acende o interesse de pesquisadores e amantes de musica pelo mundo, mas que jamais foi contado em um livro.
Lindo Sonho Delirante está em financiamento coletivo no Catarse, convidando todos a ajudarem a manter acessa e colorida a chama única, singular e especial da psicodelia brasileira.
Veja o vídeo abaixo:

BRock psicODélico (e outras viagens)