(texto de Maurício Nunes)
Há dias atrás o rock nacional perdia uma de suas estrelas, o cantor
e compositor Chorão. Eu nunca fui fã do Charlie Brown Jr., mas sempre
tive respeito, afinal ficava evidente que a atitude e a qualidade
musical da banda era (e talvez continue sendo) melhor que 90% do que
rola na nossa falida mídia atual. Chorão não era meu ídolo e nem
referência para meu trabalho musical, mas é notório sua sensibilidade
poética e talento absurdo para aquilo que se propunha fazer: música!
Todos sabem que o Brasil canoniza seus artistas mortos imediatamente,
mas o processo dura pouco, até começar o deboche e o festival de
oportunismo. O rapaz morreu numa época tumultuada, junto com a morte de
Hugo Chavez, a pífia e polêmica condenação do goleiro Bruno e o
julgamento-show do caso Mércia Nakashima, ficando assim sem muitos
holofotes sobre seu túmulo. Graças a este festival de acontecimentos,
esqueceram um pouco do caso da morte do músico
skatista, o que pode se considerar sorte, ao menos no caso de
preservação da imagem de quem se foi. Mas mesmo assim a Oportunismo
Barraco S/A produziu e continua na ativa com o festival de bobagens onde
pseudos-investigadores e figuras que só a TV brasileira é capaz de
fazer florescer soltam suas pérolas. Tem um vídeo na net, de um programa
de TV do Maranhão, onde o apresentador lamenta, de forma irônica, a
morte de Chorão e afirma que o carnaval da Bahia perdeu muito. Como
assim?? Depois grita Bye “xarli brau” ao som de Benito di Paula ao
fundo, onde o apresentador grotesco afirma que a canção foi feita em
homenagem à morte de Chorão (!!!). Mas no meio de tanta asneira o que
mais incomoda é o festival de “juízes divinos” taxando o falecido apenas
como um simples maluco viciado que se matou. Vamos por partes. Ninguém
sabe o que houve e muito menos se o rapaz suicidou. Segundo lugar, é
hipócrita julgar um viciado de tal forma
como se ele fosse o único da nação. Quando você enche a cara de
cerveja, whisky, ou qualquer outra droga lícita, isto não te faz melhor
do que um viciado em cocaína ou qualquer outra droga. A única diferença
entre vocês é perante a lei e claro, a quantidade que você usou. Um
baseado é nada perante dez latas de cerveja, que causam danos bem
maiores ao viciado e à sociedade às vezes. E quero deixar registrado que
não uso drogas e sou abstêmio, então não estou levantando bandeira para
ninguém, mas apenas sendo coerente. A contribuição que Chorão, Raul
Seixas, Elis, Cazuza e tantos outros deixaram para nossa música, vai
muito além de suas vidas pessoais que não nos dizem respeito. O artista
deve ser visto por sua obra e não por sua vida. Se fosse assim, nenhum
jamais seria admirado, pois para ser artista e dos bons é extremamente
necessário o conflito interno ou você acha que a poesia, a música, o
livro, a obra de arte e até
artigos como este surgem como? Se fosse tão simples assim todos seriam
artistas. O que de fato ocorreu e poucos captaram é que a droga mais
letal que existe é o amor e já arrancou muito mais vidas do que se
imagina. Não foram os aviões que mataram King Kong, mas sim o amor pela
Bela, a causa mortis da Fera! Quando se ama de verdade e por um motivo A
ou B o amor de um acaba, é difícil o outro se reerguer e não há fama,
grana, talento que o salve. Quem ama nunca abandona o outro, nem na pior
situação. Se um dia acabou, não era amor, então é tarde para lamentar a
morte, pois isto não serve para nada se você poderia ter evitado. Só
quem AMA de verdade sabe a dor que é a solidão. Solidão esta opcional,
pois não faltariam companhias femininas ao Chorão, como não falta a
muita gente que vocês conhecem, mas que optou viver um amor que não mais
é correspondido. O amor é a arma na cabeça e a cocaína, a bebida, o
crack, seja la o que
for, é a mão que aperta o gatilho.
Maurício Nunes é dramaturgo, músico e jornalista.
Muito bom.
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